domingo, 18 de janeiro de 2015

"Eu era palavras..."

        Lá pelas tantas da minha primeira década de vida, com meus sete ou oito anos, eu só sabia escrever. Me destacava em redação no colégio, e em casa também. Ainda lembro dos olhos orgulhosos de minha mãe ao receber as avaliações. Eu era palavras.
        Gostava de brincar, embora isso dificilmente ocupasse grande parte do meu tempo. Se me dessem brinquedos de presente, não recusava. Mas nada era mais encantador que ganhar cadernos novos, canetas e mais canetas, folhas dos mais variados tipos e tamanhos - desde que viessem em branco.
        Tinha sim alguns bonecos e carrinhos, e costumava pedir outros à minha mãe. Só que nas minhas mãos, não eram tratados como simples objetos.
        (Dê um herói de trinta centímetros a qualquer criança e conte quantas semanas ele aguentará. Não há homem-aranha, batman ou ranger que não perca um braço até o primeiro mês fora da embalagem)
        Comigo não. Exceto esses que já vêm com suas tramas prontas, eu adorava usá-los como personagens da minha cabeça tão inexperiente. Criar (histórias) e dar vidas era então, mais interessante que um jogo, um ioiô, uma partida mirim de futebol...
        Quando no colégio aprendia uma nova técnica, nas aulas de português e redação que eram as mais esperadas da semana, eu mesclava rapidinho às bobagens que naturalmente já havia inventado. Alguns personagens ainda estão de pé (ou em ótimo estado de conservação - se preferir). Dos impressos, infelizmente me desfiz, sem querer, é claro.
        Hoje, acredito no quão ruim era tudo o que eu produzia. De qualquer forma, qual criança em pleno 2015, trocaria um tablet por papel e caneta?
        "Papel e caneta? Que anacrônico! Isso já era, os tempos são outros..."
        Não concordo nem discordo. Muito pelo contrário. Acho que aplicativos que estimulassem a escrita e a criatividade seriam de um ótimo auxílio. Tô azul de ouvir que essa conectividade toda apenas complementa em alguns hábitos, como o da leitura. Porém, não é o que tá parecendo.
        Vivo com uma prima de oito anos que eu raramente vejo rabiscando alguma coisa, não se tratando de obrigações da escola, o que não conta. E nem seria preciso tê-la em casa para perceber. Semana passada, numa agência da caixa, minha atenção oscilava entre a hora de ter a senha chamada, e o escândalo causado por um loirinho que sequer alcançava a cintura da mãe.
        O motivo não podia ser outro: o baixinho queria o celular, a qualquer preço e grito. Era sim muito esperto para até mesmo dar aulas de interatividade no WhatsApp ou de obter uma boa selfie. Mas, me preocuparia bastante se ele não soubesse ainda soletrar o próprio nome.